

O Instituto Tomie Ohtake inaugurou em junho um novo ciclo expositivo que reafirma seu compromisso com a diversidade, a memória e a representatividade no campo das artes. A programação, que se estende até agosto de 2025, apresenta quatro mostras que colocam em evidência trajetórias potentes, muitas vezes silenciadas ou invisibilizadas pela história oficial da arte brasileira. Mais do que exposições, o que se revela nesse momento é um projeto curatorial que enxerga a arte como instrumento de resistência e transformação social — e que convida o público a repensar os espaços culturais como lugares de pertencimento.
Um dos grandes destaques é a exposição Teatro Experimental do Negro nas fotografias de José Medeiros, realizada em parceria com o IPEAFRO – Instituto de Pesquisa e Estudos Afro-Brasileiros. A mostra apresenta um conjunto inédito de imagens captadas pelo fotógrafo no contexto das atividades do TEN, grupo criado por Abdias do Nascimento em 1944 como resposta direta ao apagamento de artistas negros nas artes cênicas. Por meio das lentes de Medeiros, o público mergulha nos bastidores desse movimento modernista de vanguarda, que teve papel fundamental na formação de nomes como Léa Garcia e Ruth de Souza. Fotografias, filmes, documentos e objetos revelam não apenas a rotina do grupo, mas a força simbólica de sua atuação no imaginário cultural brasileiro.
Outra exposição em cartaz é a panorâmica dedicada a Manfredo de Souzanetto, artista nascido no Vale do Jequitinhonha e reconhecido por sua contribuição à arte construtiva brasileira. A mostra percorre mais de cinco décadas de produção, apresentando pinturas, objetos e instalações que evidenciam uma investigação rigorosa sobre forma, cor, espaço e matéria. Combinando geometria e intuição, a obra de Manfredo traduz uma busca constante por equilíbrio entre estrutura e sensibilidade.
Na mesma linha de reconhecimento a trajetórias singulares, a exposição Manuel Messias – Sem Limites apresenta ao público, pela primeira vez em uma instituição cultural, um panorama da obra do artista que se destacou na segunda metade do século XX pela força de sua xilogravura. Suas gravuras em preto, branco e vermelho carregam não apenas uma carga estética expressiva, mas também uma dimensão espiritual e crítica. A curadoria assinada por Marcus de Lontra Costa e Rafael Fortes Peixoto propõe uma releitura do legado de Manuel Messias, afirmando seu lugar legítimo na história da arte brasileira e valorizando o papel da gravura como linguagem política e sensível.
Completando o ciclo, o Instituto recebe a Casa Sueli Carneiro em residência, iniciativa fruto de uma parceria com a Casa Sueli Carneiro, referência no fortalecimento do pensamento negro no Brasil. A exposição apresenta os resultados do Programa de Residência realizado em 2024, com sete projetos artísticos desenvolvidos a partir de experiências e vivências de artistas negras e negros. Além disso, integra à mostra uma biblioteca circulante e objetos do acervo pessoal de Sueli Carneiro, filósofa, ativista e uma das mais importantes vozes do feminismo negro na diáspora. Ao dar protagonismo às epistemologias negras, a residência não apenas amplia o alcance do museu, mas transforma sua relação com os territórios, os corpos e as narrativas historicamente excluídos.
Esse novo ciclo expositivo do Instituto Tomie Ohtake é um convite à escuta, ao olhar e à revisão. Mais do que ocupar paredes com obras, ele propõe um reposicionamento institucional frente às urgências do nosso tempo. As exposições afirmam o papel das artes na construção de uma sociedade mais justa e plural, onde a diversidade não seja exceção, mas princípio. Ao reunir artistas, coletivos e iniciativas que pensam a arte como linguagem de denúncia, celebração e pertencimento, o Instituto consolida-se como um espaço de referência para o debate sobre cultura e democracia.
Todas as exposições têm entrada gratuita e acontecem simultaneamente na sede do Instituto, em São Paulo. Mais do que uma visita, trata-se de uma experiência que nos convida a enxergar a arte — e o mundo — a partir de novas lentes.